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Cora Pavan Capparelli

Cora Pavan Capparelli: a mulher a frente do seu tempo, uma história de amor e música

Uberlândia amanheceu mais triste nesta sexta-feira (12), com a notícia da morte de Cora Pavan de Oliveira Capparelli, ou Dona Cora. Uma mulher que foi protagonista de sua história e parecia estar sempre a frente do seu tempo. A pianista que dá nome ao Conservatório Estadual de Música em Uberlândia faleceu nesta madrugada, mais uma vítima da Covid-19, depois de quatro dias internada. Se já não bastasse a tristeza da notícia em si, para amigos mais próximos e familiares o sofrimento foi duplo. A notícia de sua morte começou a se espalhar por arquivos de mensagens na noite de ontem, enquanto ela ainda respirava. A morte foi confirmada no início da madrugada. Chega a ser irônico porque se tem uma coisa que Dona Cora nunca teve foi pressa! Em qualquer ocasião, ela encontrava tempo para tudo e para todos. Estava sempre pronta para um abraço, um apertar de mãos e queria saber tudo que estava acontecendo na vida do seu interlocutor.

A situação de caos instalada em nosso país por conta da pandemia impede que Dona Cora tenha uma despedida à sua altura. O legado que ela deixa é único. Seu papel na música em Uberlândia é digno de filme. E virou filme pelo olhar de Nara Sbreebow em “Tons de Cora” (2014), que você pode conferir na íntegra no YouTube. Fatos importantes da trajetória da musicista são contados de forma não linear em uma produção que traz uma linguagem também de documentário.

“Tons de Cora”, filme de Nara Sbreebow lançado em 2014

Estar na presença de Dona Cora era sempre um privilégio, momentos que nunca aconteciam em sua casa sem um café da manhã ou um café da tarde com quitandas deliciosas, feitas especialmente para a ocasião. Coisas de casa de vó. Apesar de uma história marcante, Dona Cora agia sempre com muita humildade, sempre creditando seu sucesso também a todos aqueles que estiveram a seu lado. Querida no meio cultural, como poucos, soube valorizar todo espaço que conseguia. Com a mídia, sempre teve um relacionamento de carinho e respeito. Chegava a enviar às redações quitandas que iam acompanhadas por cartões carinhosos de agradecimentos.

De todos os encontros que a profissão me proporcionou, esse foi um dos melhores. Foram muitos os encontros com a musicista atuando no jornalismo cultural de Uberlândia. Nossa última entrevista aconteceu em novembro de 2017. O assunto era o evento que marcaria os 60 anos do Conservatório Estadual de Música Cora Pavan Capparelli e os 92 anos de Dona Cora, que seriam celebrados em dezembro.

Todas as mesas para a noite de foram vendidas e o Palácio de Cristal mesclava toda a imponência de sua arquitetura com a grandiosidade e simplicidade de Dona Cora. Em seu discurso, novamente, ela é humilde ao falar do Conservatório. Depois de comentar sobre os alunos diplomados que estão nas mais diversas regiões do Brasil (e do mundo), seu grande orgulho, ele seguiu: “Que continuemos a reconhecera nossa pequenez. Eu reconheço a minha, a minha insuficiência quando eu penso que eu vou fazer qualquer trabalho, seja onde for. Eu tenho portas amigas para onde eu possa ir bater e receber apoio de amigos, de pessoas que vão dizer : ‘eu estou com você'”.

Cora Pavan Capparelli discursa no evento de 60 anos do Conservatório (Adreana Oliveira – 12-11-2-17)

O Concurso Nacional de Piano Cora Pavan Capparelli, que conta com 17 edições, era um dos seus principais projetos. Vale lembrar que mesmo depois de aposentada ela continuou dando aulas gratuitas para jovens talentos. Dona Cora sabia, antes de qualquer teoria de culturas de convergência, que bom mesmo é compartilhar, cada um do seu jeito.

A última entrevista

Cora Pavan Capparelli, em sua casa, na rua Santos Dumont, em Uberlândia (Adreana Oliveira/out/2017)

A entrevista a seguir foi feita originalmente para o Diário de Uberlândia, na época, ainda Diário do Comércio de Uberlândia. Você pode ler a original de 12 de novembro de 2017 na íntegra aqui.

Em26de dezembro de 1925, nascia em Uberlândia Cora Pavan Caparelli. O parto foi difícil. Uberlândia era uma cidade pequena e somente dois médicos atendiam aqui. “Cuide bem dessa menina. A senhora não poderá ter mais filhos. Disse o doutor, à mãe de Dona Cora.

Prestes a completar 92 anos de idade, a musicista será homenageada em evento que marca os 60 anos do conservatório, que leva seu nome, fundado por ela em 13 de julho de 1957, como Conservatório Musical de Uberlândia, passando a Conservatória Estadual Cora Pavan Capparelli, em 1967.

A filha única do político Angelino Pavan e da modista Adélia de Oliveira Pavan, cresceu saudável e feliz. É uma das personalidades marcantes da cultura em Uberlândia. Em uma época em que a mulher não tinha muitas escolhas se não tornar-se esposa e mãe, a pianista precisou da autorização do pai para estudar Canto e Música no Conservatório Dramático e Musical e História e Geografia na Pontifícia Universidade Católica (PUC), ambos em São Paulo.

Cora Capparelli foi uma das primeiras mulheres graduadas da cidade. Ela gosta de receber os repórters em sua casa em meio ao tumultuado centro de Uberlândia. Na sala, o piano chama atenção pela beleza, por todos os lados, fotos da família, que sofreu uma grande perda em quatro de dezembro de 2016. O patriarca, o médico Vittorio Capparelli, faleceu aos 101 anos. Eles se casaram em 1950. Da união, nasceram Maria Cristina Capparelli Guerling, Vittorio Amílcar Pavanca Parelli e Sílvio Capparelli.

Dona Cora se orgulha e tem paixão pela família. “Já tenho oito netos, oito bisnetos e mais uma bisneta a caminho. Sou uma pessoa de sorte. Acompanho o crescimento dos meus netos e bisnetos. Faço álbuns de fotos deles. Estou atenta ao que meus filhos fazem. Desde o falecimento do Vittorio, eles e a música me ajudam a seguir em frente. Sou uma pessoa simples e muito feliz. Apesar das limitações da idade”, disse ela na época.

Ainda muito requisitada pelo Conservatório, ela participa de reuniões e opina sobre diversos assuntos sempre que solicitada. “Jamais imaginei que fosse assistir e falar para alguém que a escola foi fundada há sessenta60 anos. É uma distância grande e ainda há tanta gente daquele tempo que vivos e bem, professoras e professores, amigos e amigas íntimos. Sou agradecida pela bondade de Deus porque eu não pensava que estaria viva, 60 anos depois”.

Ela conta que o trabalho era intenso. Na época em que ele dirigia o Conservatório de Uberlândia, lecionava em Araguari, cidade a cerca de 30km de Uberlândia, três noites por semana. “A estrada era ruim, viajávamos, eu e a professor Geralda Guimarães. Eu dirigindo. Meus pais me esperavam acordados”.

Dona Cor está feliz por acompanhar toda evolução pela qual passam a música e o conservatório. “É bom ver as crianças cada vez mais dispostas a se aventurar pela música. É preciso incentivar isso. Quanto aos professores, é fundamental ter paixão pelo que faz. Eu sempre amei lecionar, sou vocacionada pelo ensino da música, aprendi que a música faz bem para nosso corpo, para nosso organismo e para a nossa alma. A música é a minha companheira constante”.

Sobre os momentos mais marcantes da história do Conservatório, ela cita um concerto com mil vozes realizado na praça Tubal Vilela, a poucos metros de sua casa, no Centro de Uberlândia. Entre seus compositores favoritos está Frédéric Chopin e aprecia também compositores brasileiros.

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