Banda Municipal de Uberlândia celebra 70 anos de trajetória com muitas histórias
Tá tudo tão quieto aqui. Eu nunca aguentei o silêncio. Preciso ter sempre alguma música em algum lugar da minha cabeça. Mantém o equilíbrio das coisas. A música faz isso, preenche as coisas. Quanto mais música existir no mundo mais completo ele é.
A frase acima é da cantora de blues Ma Rainey, brilhantemente interpretada por Viola Davis, no filme “A voz suprema do Blues” (2020, George C. Wolves), disponível na Netflix. Tem muita verdade nessa declaração.
São sete notas musicais com combinações infinitas que ganham significados diferentes não só a partir de quem faz, como a partir de quem ouve. Muitas dessas canções são conhecidas por séculos graças ao trabalho das bandas que as interpretam ao longo do tempo.
Neste mês de maio a Banda Municipal de Uberlândia (BMU) comemora 70 anos de história, que começou em um 1º de Maio, durante um desfile do Dia do Trabalhador, em 1951, como Lira Musical César Bombonato. O repertório inicial voltado para dobrados e valsas ganhou canções mais populares e ficou mais variado, atraindo também um público mais jovem por meio de projetos como a Udi Jazz Ban Udi Jazz Big Band com ritmos como jazz, blues e bossa nova.
De lá para cá, foram muitas histórias, são muitas histórias que permeiam sua trajetória. Joheber Antônio Silva ingressou na BMU há 37 anos e hoje ocupa um posto que já foi de seu pai, Bento Silva: maestro.
Atualmente, por conta das restrições impostas pela pandemia, a banda tem realizado lives e mantém seus ensaios em espaço aberto no Centro Municipal de Cultura (CMC), bem no Centro de Uberlândia. “Ali naquele espaço, que está com circulação restrita, percebemos quando as pessoas param um pouco no meio da correria só pra ouvir o que estamos tocando. Tem gente que pede para entrar e conferir mais de perto, que quer saber mais sobre a banda”, contou o maestro.
A gente não escolhe a música… a música escolhe a gente!
Joheber Antônio Silva
E a música não para. A saudade de estar perto do público é grande e os ensaios seguem de forma segura porque a perfeição não chega para quem não pratica, não se dedica como deve. “No momento as lives, que são disponibilizadas na plataforma Cultura em Casa, amenizam a saudade, é preciso pensar na segurança de todos e acredito que as pessoas vão valorizar mais a arte depois desse período porque é a arte que tem trazido um pouco de alento para as pessoas em tempos tão difíceis”, comentou Joheber.
A música entrou na vida dele ainda na infância, os estudos começaram quando tinha 10 anos de idade, no Conservatório Estadual de Música Cora Pavan Capparelli. “Acho que a gente não escolhe a música, ela escolhe a gente. Vendo o trabalho do meu pai como maestro me apaixonei pela Banda e foi uma alegria quando passei no concurso para fazer parte dela”, lembrou.
O trabalho na BMU atualmente é de 15 horas semanais divididas entre ensaios, apresentações, estudos individuais e em grupos. O CMC é a terceira “casa” da banda que já teve sedes na rua Duque de Caxias e no Mercado Municipal, a primeira delas. “É o espaço no qual mais tenho lembranças, é meio nostálgico e eu era muito menino. A Banda é uma grande família, claro, como toda família tem seus altos e baixos e é isso que torna tudo mais interessante”, brincou.
E essa família composta atualmente por cerca de 50 músicos e outras três pessoas no acervo, é muito querida. Geralmente, não surgem muitas vagas. “A gente brinca que a maioria só sai quando aposenta ou quando Deus chama. E há quem se aposente e continue sendo parte da Banda, impossível não ser”.
O ingresso na BMU é por meio de concurso público e Joheber se lembra de quando fez as provas escritas e práticas. “Não é nada fácil. Tive aquele nervosismo, aquele frio na barriga e uma alegria imensa com a aprovação”.
Presença feminina em ascensão
Para Rosana Borges Kawaguici Fernandes essa emoção foi um pouco maior porque quando ela entrou na BMU, há 26 anos, as mulheres ainda começavam a marcar presença. “Quando entrei havia somente três mulheres porque só foi permitido a nós participar do concurso na edição anterior ao que eu participei”, lembrou.
Assim como Joheber, Rosana, que toca flauta transversal na BMU, teve influência musical dentro de casa e passou ao filho o gosto pela música. “Eu fiz conservatório e graduação em Música. Meu filho preferiu seguir com aulas particulares e a música é isso, cada um tem seu jeito de levar. Além de toda a cultura passada pela música por meio dos estudos de composições e compositores, essa atividade ajuda em outros campos de nossas vidas porque melhora a concentração. Na maior parte do tempo, a música é matemática”, explicou a flautista.
Tem gente que pergunta por que eu não faço outra coisa. A resposta é bem simples: Eu sou feliz aqui. E amo estar na Banda!
Rosana Borges Kawaguici
Rosana reforça que não é preciso ser um performer para ser musicista, o filho, ao contrário dela, não pretende ter na música uma profissão, mas como algo para relaxar, uma conexão com ele mesmo. “Já tivemos projetos na BMU como a Banda Jovem e a Banda Mirim. A Banda acaba sendo uma escola também e o que mais me alegra é saber que existem muitas possibilidades para nós”.
A participação na Banda é uma escolha de Rosana. “Tem gente que pergunta por que não faço outra coisa. A resposta é bem simples: Eu sou feliz aqui. Eu amo estar na banda! Há sacrifícios sim, tocamos em horários em que a maioria das pessoas não está trabalhando e levamos alegria para elas. Isso não tem preço. Eu escolhi estar na Banda”.
Atualmente a BMU tem oito mulheres na formação. Para Rosana, apesar de ainda ser um ambiente predominantemente masculino, a presença feminina é celebrada por todos. “Até os músicos dizem que tornamos o ambiente de ensaio melhor, mais leve”.
Para flautista, filha de professora de música que já integrou uma banda feminina que existiu em Uberlândia entre os anos 20 e 40 (pauta para uma outra reportagem), a presença da mulher na música e nas bandas em geral já foi permeada por preconceito. “No início a Banda era marcial. Tinha que marchar, subir em caminhão, nem o figurino ajudava. Sem falar na educação musical em si que para a mulher ficava geralmente entre o piano e o acordeão. A maioria delas não aprendia instrumentos tocados pela Banda. É bom perceber que esse quadro mudou e vai mudar ainda mais”.
BMU – 70 ANOS
Músicos da Banda Municipal de Uberlândia: Abrãao Cardoso – Trombone | Adeilson de Aguilar – Sax Tenor | Amauri do Nascimento – Trompete | Assis Aparecido – Clarinete | Carlos Henrique – Trompete | Cecília Ramos – Flauta | Cláudio Batista – Tuba | Clayton Miranda – Trombone | Daniel Lacerda – Flauta | Denilson Lima – Trombone | Diego Meireles – Percussão | Éder Luiz – Tuba | Elcione de Lima – Percussão | Elias Gomes – Sax Alto | Erick Fernando – Flauta | Fernanda Souza – Clarinete | Flávio Humberto – Percussão | Isaías Silva – Sax Barítono | Ivy Anne – Flauta | Jean Carlos – Flauta | João Batista – Trompete | Jorge Stefson – Tuba | José Luiz – Trompa | José Radamés – Clarinete | José Roberto – Trombone | Júlio César – Trompete | Leandro Aparecido – Sax Alto | Luciene Alves – Sax Alto | Manoel Barros – Lira | Manoel Moura – Percussão | Maurício de Oliveira – Bombardino | Mauro Rosa – Sax Tenor | Natanael Marcelino – Trompete | Pablo Anastácio – Percussão | Patrícia Cristina – Clarinete | Paulo Melo – Percussão | Priscila Costa – Clarinete | Robson Carvalho – Trombone | Rogério Moura – Sax Tenor | Rosana Borges – Flauta | Sérgio Geraldo – Percussão | Silmar Barbosa – Bombardino | Walter Andrade – Bombardino | Washington Luiz – Sax Alto | Wellisgton Pereira – Trompete | Wenes Petrucci – Trombone
Maestros: Joheber Antônio Filho | Ricardo Carrijo
Acervo: Celso Brito | Adenilson Barbosa | Paulo Leonardo
Diretor: Samuel Borges